Incerteza, essa tem sido a palavra que ronda o mercado global nas últimas semanas, impulsionada pelas ações do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Em meio a anúncios e recuos envolvendo novas tarifas de exportação para diversos países — inclusive o Brasil —, o setor imobiliário nacional se vê diante de um cenário de difícil previsibilidade.
A instabilidade começou no dia 2 de abril, quando Trump anunciou tarifas que variavam entre 10% e 50% sobre produtos de 180 países. A resposta internacional não demorou: diversas nações adotaram medidas de retaliação, elevando tributos sobre mercadorias norte-americanas.
Nesta quarta-feira, porém, Trump voltou atrás. Informou que as tarifas recíprocas cairiam para 10%, com validade de 90 dias — com exceção da China, que teve sua tarifa elevada para 125%, com aplicação imediata. As decisões, divulgadas principalmente por meio da rede social criada pelo próprio Trump, têm gerado instabilidade e deixado setores inteiros em alerta.
Para o mercado imobiliário, as consequências ainda são incertas, mas já há sinais de possíveis impactos. “É difícil prever o cenário a longo prazo porque estamos falando de um presidente que não dá para antecipar o próximo passo. Tudo pode mudar”, afirma Daniel Ribeiro, CEO da G.D8 Incorporadora. “A curto prazo, a previsão é que o setor de construção civil seria totalmente impactado, desde estruturas até acabamentos”, pontua.
Segundo Ribeiro, uma eventual taxação pode causar excesso de oferta interna e consequente desvalorização de preços. “Essa desvalorização seria ainda mais pressionada pela oferta de produtos chineses que deve se espalhar pelo mundo para compensar a taxação americana”, explica.
Impacto nos insumos e na inflação
Dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços revelam que, em 2024, os Estados Unidos compraram quase 40% da produção brasileira de aço e alumínio destinada à exportação. Ainda assim, especialistas acreditam que os impactos diretos sobre os insumos da construção civil no Brasil tendem a ser moderados.
“Dependemos pouco de produtos americanos para a construção de unidades habitacionais no Brasil. Então, se houver reciprocidade, acredito que não teremos aumento no preço de insumos em um primeiro momento”, avalia Murillo André Mendonça, professor de pós-graduação do Centro Universitário Facens. Segundo ele, a preocupação maior deve estar na inflação de outros itens.
Essa análise é compartilhada por Fábio Moraes, economista da E2+, que chama atenção para a dependência americana de produtos transformados de alumínio. “Os EUA têm uma elevada dependência da compra de transformados de alumínio, com baixa capacidade de substituir esses produtos importados por produção local no curto prazo”, afirma.
Nesse contexto, a indústria norte-americana — especialmente os setores da construção e automotivo — pode enfrentar um aumento expressivo nos custos. “Ou o governo voltará a negociar cotas de importação para países parceiros”, sugere Moraes.
Com isso, há espaço para uma reconfiguração do comércio global. Produtos que antes eram direcionados aos Estados Unidos agora devem buscar novos mercados, inclusive o Brasil. “Na teoria, o aumento da competição no mercado doméstico poderia gerar redução de custos para o setor da construção e imobiliário”, destaca o economista.
Insegurança econômica e juros em alta
Apesar de os efeitos práticos ainda estarem em aberto, o vai-e-vem das medidas tarifárias tem alimentado o risco e a desorganização nas expectativas econômicas. “Uma resposta natural ao aumento dos riscos é a alta nas taxas de juros”, explica Carlos Honorato, professor de economia da FIA Business School. “Numa tática de negociação pouco estratégica, Trump gera turbulência”, complementa.
Honorato aponta ainda para possíveis motivações da política tarifária do ex-presidente. “Uma das teorias é que ele começou a fazer esse movimento com o objetivo de minimizar os custos da dívida americana, mas o resultado pode ser um aumento local de juros”, analisa. Esse aumento poderia desencadear uma recessão global, com reflexos diretos sobre os juros no Brasil — o que impactaria o setor imobiliário de forma negativa. “Desta forma, o mercado imobiliário fica menos propício à venda de imóveis”, conclui.
Em meio ao cenário volátil, o maior entrave continua sendo a imprevisibilidade. “Toda essa instabilidade que você tem na economia chega ao investidor e ao comprador, que podem preferir esperar um pouco mais antes de entrar numa roubada”, avalia Honorato.
Para os especialistas, ainda é cedo para determinar o real alcance das políticas tarifárias de Trump. Mas uma coisa é certa: “Este diagnóstico é difícil justamente pela forma errática que o governo tem conduzido a questão”, reforça Moraes.
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Informações retiradas Bruno Damascena ao Estadão