É um consenso que as medidas de enfrentamento da pandemia do coronavírus têm efeitos colaterais graves nos mais diversos setores da economia. O impacto nos contratos imobiliários é um dos mais preocupantes, já que o setor tem forte presença no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.
Segundo o IBGE, 2020 era considerado um ano promissor para o mercado imobiliário, com crescimento projetado entre 2% e 4%. Em 2019, o PIB da construção civil havia tido sua primeira alta desde 2014, de 1,6%.
A chegada da Covid-19, no entanto, alterou drasticamente esse cenário. Hoje, para Ibre/FGV, a expectativa é que o PIB do setor amargue uma queda de 7,2%, com recuo de 3,4% do PIB total.
As medidas de isolamento social são necessárias para ajudar a reduzir a curva de contágio enquanto vacina e medicamentos eficientes de combate aos sintomas não surgem. No entanto, é praticamente impossível evitar um forte impacto nos contratos imobiliários.
O que deve acontecer com os contratos imobiliários
Segundo a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) havia uma expectativa de aumento entre 20% e 30% nos lançamentos imobiliários em 2020.
Com isso, a estimativa era que fossem gerados cerca de 5,5 milhões de postos de trabalho através da construção de 1 milhão de novos imóveis.
O aparecimento do coronavírus, no entanto, fez com que a situação ser revertesse totalmente.
Hoje, há empresas com obras paralisadas, outras em férias coletivas ou redução de salários e jornadas de trabalho.
Os resultados calculados são atrasos em todos os aspectos do setor, o que impacta negativamente os contratos imobiliários.
Assim, se entre as empresas a situação é crítica, na outra ponta são os consumidores, com seu sustento em risco, que também enfrentam dificuldades para honrar seus compromissos.
De ambos os lados, é preciso ficar atento sobre as possibilidades legais de cada situação.
No entanto, se esse é um contexto totalmente novo e imprevisto, onde encaixar os últimos acontecimentos? Há pressupostos legais que amparem as partes minimizando prejuízos?
Contratos imobiliários entre incorporadoras e construtora
À luz do Código Civil, que rege os contratos entre incorporadoras e construtoras, é do construtor os riscos referentes aos prazos de conclusão das obras e aos problemas de mão de obra e materiais.
Salvo disposição em contrário, essa responsabilidade é contratual, com prazos e valores definidos.
Entretanto, quando há exclusão de responsabilidade por caso fortuito ou força maior (artigo 393² do CC) ou resolução por excessiva onerosidade subserviente (art 478³) o construtor está amparado legalmente contra as sanções contratuais pelo atraso da empreitada.
Assim, há a possibilidade de enquadramento no contexto atual, desde que esteja configurada imposição do poder público que gere:
- Paralisação da obra ou escassez de materiais no mercado de forma a afetar o andamento normal da empreitada;
- Impedimento ou restrição do acesso de funcionários ao canteiro de obras;
- Impacto no prazo, no custo ou em ambos simultaneamente.
Atraso na entrega das chaves para o consumidor
Situação parecida, portanto, com possíveis atrasos na entrega das chaves superiores aos 180 dias já tolerados pela legislação. Também, nesse caso, há possibilidade de alegação de caso fortuito ou força maior por parte das incorporadoras.
A expectativa é que os tribunais aceitem a alegação em função da pandemia e das medidas legais tomadas pelos governos nas várias esferas, visando a mitigação dos efeitos do coronavírus.
Rescisão do compromisso de compra e venda por parte do consumidor
Havendo uma comprovação de perda de emprego ou da renda que justifique a impossibilidade de prosseguimento do compromisso de compra e venda, o consumidor pode, da mesma forma, usar o conceito de caso fortuito ou força maior para o distrato.
No entanto, é preciso atentar para o fato de que, a princípio, a perda do emprego, por si só, não constitui fato inevitável e imprevisível, ainda que causado pela pandemia.
A Lei do Distrato (Lei nº 13.786/2018) concede o direito de resilição unilateral do contrato por parte do promissário comprador.
Para isso, no entanto, é preciso que sejam observadas as punições compensatórias de 25% a 50% de multa de acordo com a existência ou não de patrimônio de afetação.
Contratos imobiliários de locação
Atrasos nos contratos imobiliários de locação também merecem atenção. No caso da locação comercial, por exemplo, o fechamento obrigatório em vários locais não pressupõe o fim da cobrança do aluguel e demais encargos.
Entretanto, lojas de rua ou de shoppings impedidos de abrir duas portas, têm o movimento drasticamente reduzido ou zerado, de acordo com a determinação do poder público.
O desequilíbrio entre custo (encargos e aluguel) e proveitos (uso regular e serviços agregados) causado pelo fechamento compulsório absoluto ou parcial podem estar sujeitos a revisão de acordo com os artigos 317 e 478 do CC.
É preciso estudar a possibilidade de aplicação de um ou ambos artigos, que têm como base a Teoria da Imprevisão ou Teoria da Onerosidade Excessiva.
De qualquer forma, ainda que os estudos acerca da legalidade de ações que visem minimizar os prejuízos sejam necessários, é preciso levar a negociação com bom senso e solidariedade.
A medida é necessária também no âmbito das locações residenciais, em que o provedor é prejudicado em parte ou na totalidade de sua renda de sobrevivência.
O certo é que o corretor deve estar atento para melhor orientar seus clientes, sendo este um momento único e de muito cuidado para os setores jurídicos das imobiliárias.
Ainda que pouco sejam conhecidos todos os impactos reais da Covid-19 nos contratos imobiliários, é preciso agir com adequação e discernimento, uma vez que o cenário é absolutamente inédito para todas as partes.
Como tem sido a sua experiência com os contratos imobiliários durante a pandemia? Como tem procurado resolver os problemas e orientar seus clientes? Compartilhe conosco a sua experiência e colabore para tornar esse momento mais leve e justo!