A classe média brasileira enfrenta um grande desafio para acessar o mercado imobiliário, seja para aluguel ou compra. A discrepância entre o aumento do preço dos imóveis e o crescimento da renda tem levado muitos brasileiros a abrir mão de aspectos essenciais, como localização, metragem e comodidades. O impacto dessa disparidade pode ser observado nas regiões mais valorizadas de São Paulo, onde o preço do metro quadrado tem subido a um ritmo muito superior à evolução dos rendimentos da população.
De acordo com cálculos do DataZap/Grupo OLX, o preço de um imóvel no valor de 780 mil reais, como o de um casal da classe média, seria equivalente, em 1995, a 100 mil reais. Naquela época, esse apartamento poderia ser comprado com 100 salários médios. Hoje, no entanto, seriam necessários cerca de 262 salários para adquirir o mesmo imóvel.
Além disso, a rentabilidade da classe média tem se mostrado cada vez mais aquém da valorização do mercado imobiliário. De 2012 a 2024, a renda do brasileiro cresceu 10,5%, enquanto o preço dos imóveis subiu 28,4%, segundo dados do IBGE e do Índice FipeZap. O aumento no valor do metro quadrado está diretamente relacionado à escassez de materiais de construção, agravada pela pandemia, e à alta demanda por terrenos urbanos nas áreas metropolitanas, onde a oferta continua limitada.
A alta de preços também é influenciada pela política de outorga onerosa, um custo adicional que as prefeituras cobram para o direito de construir, tornando o custo de empreendimento para a classe média ainda mais alto em áreas como São Paulo. A solução proposta por alguns especialistas, como o professor João da Rocha Lima Júnior, é a diminuição do tamanho dos imóveis, estratégia incentivada pelo Plano Diretor da cidade. Porém, isso gera imóveis com menor qualidade de vida, dificultando aspectos como a convivência e a individualidade dos moradores.
Em resposta a essa realidade, o programa “Minha Casa, Minha Vida (MCMV)” tem sido um importante aliado para as classes mais baixas. A correção no valor máximo dos imóveis permitidos pelo programa e o aumento do orçamento do FGTS têm impulsionado o setor econômico, com o lançamento de novos empreendimentos voltados para essa faixa da população. Porém, esse movimento também tem impactado a classe média, que viu o lançamento de imóveis de médio padrão cair 19% no primeiro semestre de 2024.
Outro desafio crucial para a classe média é o financiamento habitacional. Desde novembro de 2024, a Caixa Econômica Federal implementou novas regras para a concessão de crédito para imóveis usados, exigindo maiores valores de entrada. No Sistema de Amortização Constante (SAC), a entrada aumentou para 30% do valor do imóvel, enquanto na tabela Price, a exigência é de 50%. Com isso, a classe média, que depende desse tipo de financiamento, enfrenta um longo caminho para reunir o valor necessário para a entrada, especialmente em um cenário de alta inflação e endividamento.
A menor oferta de imóveis também pressiona os preços, e quem não tem recursos à vista precisa recorrer ao financiamento. De acordo com Luiz França, presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras (Abrainc), a classe média é a mais afetada pelas mudanças nas regras de financiamento, pois é justamente essa faixa que mais depende do crédito habitacional.
Apesar das dificuldades, algumas incorporadoras têm se adaptado ao cenário. A Trisul, por exemplo, tem diversificado seus lançamentos, apostando no mercado econômico, mas mantendo o foco no médio e alto padrão. O presidente da empresa, Jorge Cury, reconhece que o poder aquisitivo da classe média foi impactado pelas altas de juros, mas acredita que a classe média ainda possui demanda por imóveis, especialmente os mais diferenciados.
Apesar das estratégias adotadas pelas incorporadoras, a perspectiva para a classe média é de um cenário ainda desafiador. Com a Selic projetada para ficar em 13% em 2025, muitos agentes do mercado acreditam que o poder de compra da classe média pode continuar em declínio, embora a expectativa de crescimento econômico e a baixa taxa de desemprego possam trazer alívio em médio prazo.
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Informações retiradas de Rebecca Crepaldi à Exame