Nos últimos dias, um episódio envolvendo uma denúncia de racismo se tornou pauta nas redes sociais. O humorista e youtuber Eddy Junior relatou que sua vizinha se recusava a usar o mesmo elevador que ele e o ofendeu com xingamentos racistas, como “macaco, imundo, feio, urubu e neguinho perigoso”.
Esse episódio trouxe a tona outros casos de racismo no meio imobiliário. E por isso buscamos casos e especialistas que pudessem nos ajudar a trazer mais dados e informações sobre esse assunto.
Infelizmente o racismo imobiliário existe
O Mapa da Desigualdade 2021 mostra que o racismo imobiliário existe sim no Brasil, e que isso inclusive se reflete em bairros monocromáticos. De acordo com o documento, Moema (centro Sul de São Paulo) tem apenas 5,8% de seus moradores pretos ou pardos. Em compensação, 60,1% dos moradores do Jardim Ângela, na Zona Sul da capital, se encaixam nesse perfil.
De acordo com Anna Lyvia Ribeiro, advogada com atuação em Direito Imobiliário e autora do livro “Racismo Estrutural e Aquisição da Propriedade”, mesmo não havendo uma segregação formal no Brasil, como houve nos Estados Unidos, é possível identificar bairros de negros (geralmente periferias) e bairros de brancos facilmente. E isso fica claro na queda do valor de mercado e na forma como a sociedade identifica aquele imóvel.
“No momento da procura, a gente identifica uma dificuldade maior de locação do imóvel para pessoas negras, principalmente em locais de alto padrão. Logo de cara, existe um questionamento da capacidade econômica daquela pessoa que não é comum com cidadãos brancos. E o mesmo acontece na compra e venda, em que negros são empurrados para regiões mais distantes”, afirma.
A empresária e profissional de estatística Sauanne Bispo é um bom exemplo. Ela conta que olhava um apartamento em um aplicativo e a proprietária enviou um link para vídeos do imóvel, mas assim que migraram para o Whatsapp alguma coisa mudou.
“Assim que ela viu minha foto, passou a me perguntar se eu tinha condições de pagar o valor que estávamos acertando, se eu tinha observado os números com atenção, etc.”, lembra.
Ela conta que precisou “criar uma cena” para alugar o apartamento que queria. “Cheguei atrasada de propósito e abri o teto solar para que o corretor visse qual era o meu carro. No mesmo dia, eu já estava apertando a mão do proprietário e alugando um apartamento de mais de 200m²”, relembra.
Ela, que conhece mais de 35 países, diz que no Brasil é onde onde se sente pior. “Aqui preciso ser sempre a pessoa mais arrumada do prédio. Nunca sou vista como alguém que frequenta os lugares que eu frequento, que dirige o carro que eu dirijo ou que mora onde eu moro”, afirma.
Nas redes sociais é comum encontrar inúmeros casos parecidos com o de Sauanne.
Bairros pretos e de gentrificação
Para Paula Santoro, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP) e coordenadora do LabCidade, explica que o racismo imobiliário é controlado pelo fluxo e comprovação de renda na concessão do financiamento imobiliário. “Isso faz com que os territórios se tornem mais brancos a partir das transformações imobiliárias. Cada novo lançamento acelera a tendência”, aponta.
Para ela, o Centro de São Paulo é referência, sendo, tradicionalmente, um território popular negro. Mas os movimentos imobiliários estão promovendo mudanças significativas em termos de raça e renda: “O Brooklyn, em Nova York, era um bairro povoado por negros e pela população pobre imigrante. Hoje, (os moradores) são brancos norte-americanos.”
Imobiliárias digitais tem ajudado no combate ao racismo
Nos últimos meses é possível ver nas redes sociais a crescente indicação do uso de aplicativos para alugar imóveis, como uma solução para pretos encontrarem um lar sem grandes dificuldades. Isso acontece, porque ao usar o aplicativo de uma Imobiliária digital, você diminui o contato entre proprietários e inquilinos, e a comprovação de renda e garantia locatícia são realizadas de modo automático não dando margens para pré-questionamentos. Com os aplicativos até mesmo a assinatura do contrato é realizada de modo eletrônico agilizando o processo pós aprovação dos dados. Assim, quem faz toda a intermediação é a imobiliária e de modo majoritariamente eletrônico, o que dá a todas as pessoas interessadas, as mesmas condições.
Anna Lyvia Ribeiro lembra que o racismo é crime no Brasil, mas que o racismo imobiliário ainda é muito difícil de ser comprovado. “O caminho para que isso mude é seguir denunciando e reunindo o máximo de provas possíveis” complementa.
Por isso é importante que as Imobiliárias e outras empresas do setor, orientem seus profissionais para que estejam aptos a lidar e combater essas situações, assim como também podem desenvolver ou adotar soluções que ajudem a trazer mais igualdade de condições no momento da locação.