O Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), principal fonte de financiamento imobiliário bancário no Brasil, encerrou 2024 com uma saída líquida de R$ 21,7 bilhões, segundo dados do Banco Central. Esse cenário resultou em atrasos na liberação de recursos, especialmente na Caixa Econômica Federal, o maior financiador da casa própria do país. Para muitos compradores, essa dificuldade impactou diretamente o planejamento financeiro, tornando a aquisição de imóveis mais complexa.
Especialistas e entidades do setor apontam que o problema não foi pontual e reflete uma crise sistêmica de falta de recursos, que pode comprometer novos financiamentos em 2025 e nos próximos anos.
Atrasos na liberação de crédito impactam compradores
Muitos brasileiros enfrentaram dificuldades para acessar o crédito imobiliário em 2024. Um exemplo é o de um casal de São Paulo que, mesmo com a aprovação de um financiamento de R$1,3 milhão, não conseguiu aguardar a liberação dos recursos pela Caixa e precisou buscar outras alternativas financeiras.
A família, que possuía um apartamento quitado na Zona Norte da capital paulista, decidiu se mudar para a Zona Oeste. Com recursos próprios, deram entrada em um imóvel novo, planejando financiar o valor restante pela Caixa. No entanto, um atraso na obra adiou a assinatura do contrato e, nesse período, o antigo imóvel foi vendido, obrigando-os a reavaliar o planejamento financeiro.
Ao retornarem à Caixa para solicitar um financiamento menor, de R$350 mil, receberam a informação de que havia um contingenciamento de recursos, sem previsão de normalização. Diante disso, optaram por contratar um financiamento no Bradesco, com juros superiores aos da Caixa, mas sem a possibilidade de utilizar o saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). A decisão resultou em um custo mensal cerca de R$1 mil mais alto, além da necessidade de pagar aluguel até a liberação das chaves do novo imóvel.
Casos semelhantes ocorreram em outras regiões do país. No Rio de Janeiro, um casal que havia conseguido a aprovação de R$210 mil para financiar 70% do valor de um imóvel enfrentou sucessivos adiamentos na assinatura do contrato. Após quatro meses de espera, somente após a vistoria e a liberação do dinheiro pela Caixa puderam dar aviso de saída do apartamento alugado.
Financiamento imobiliário enfrenta desafios
A escassez de recursos para financiamento habitacional não é uma preocupação recente. A Caixa, responsável por grande parte dos financiamentos imobiliários do país, afirmou que precisou adequar as cotas de financiamento devido ao ritmo acelerado de saques na poupança, fonte primária de recursos do SBPE.
Apesar dos desafios, os financiamentos com recursos da poupança (SBPE) totalizaram R$73,4 bilhões em 2024, representando 42,6% das contratações no país. Já os financiamentos com recursos do FGTS atingiram R$ 143,6 bilhões, um crescimento de 30,8% em relação ao ano anterior.
Além da disponibilidade de recursos, outro fator que impacta o mercado imobiliário é a demanda por crédito. Quanto maior a procura por financiamento, maior a chance de os recursos se esgotarem antes do fim do ano, dificultando novas contratações.
Medidas para ampliar o financiamento imobiliário
A Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) alerta que a falta de recursos exige novas ações para garantir a continuidade dos financiamentos. Entre as medidas defendidas pela entidade estão:
- A liberação do compulsório da poupança, que obrigaria os bancos a direcionar mais recursos para financiamentos;
- A redução do prazo mínimo de vencimento das Letras de Crédito Imobiliário (LCI) de 12 para 90 dias, tornando esses investimentos mais atrativos e acessíveis;
- O aprimoramento das regras de emissão das LCI, garantindo que esses recursos sejam direcionados para imóveis residenciais.
Em fevereiro de 2024, o Conselho Monetário Nacional (CMN) aumentou o prazo mínimo de vencimento das LCI de 90 dias para 12 meses, dificultando o resgate antecipado do investimento. Em agosto, houve uma flexibilização, reduzindo o prazo para nove meses, mas a restrição ainda impacta a captação de recursos para o setor.
A questão também está sendo discutida no Congresso Nacional por meio do Projeto de Lei 952/24, que aguarda definição de relatoria na Comissão de Finanças e Tributação (CFT). Além disso, a Abrainc defende incentivos para que instituições como o FGTS e fundos de pensão ampliem os investimentos no financiamento habitacional, evitando uma retração do setor.
Expectativas para o mercado imobiliário em 2025
A Caixa informou que, em 2024, concedeu R$223,6 bilhões em crédito imobiliário, um aumento de 20,6% em relação ao ano anterior. No total, foram 803,4 mil financiamentos, beneficiando cerca de 3,2 milhões de brasileiros. O banco também lançou, em dezembro de 2024, o crédito imobiliário atrelado ao CDI, uma alternativa que utiliza recursos livres das instituições financeiras e, inicialmente, é voltada para imóveis prontos.
Para 2025, a expectativa da Caixa é manter o mesmo nível de contratações de 2024, quando a carteira de crédito habitacional somou R$832,1 bilhões, com mais de 7 milhões de contratos ativos.
No entanto, a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) prevê uma redução de cerca de 17% no volume de crédito com recursos da poupança, estimando um total entre R$150 bilhões e R$160 bilhões para 2025.
Diante do cenário econômico, Daniela Ferrari, vice-presidente de Habitação do SindusCon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil), avalia que os consumidores deverão buscar novas estratégias para adquirir imóveis. Entre as tendências, destaca-se o aumento do valor da entrada e o financiamento direto com construtoras como alternativas para contornar os desafios no crédito imobiliário.
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Informações retiradas de Gabriela da Cunha ao Valor Investe