O setor de incorporação, começará o ano de 2022 com um cenário bem mais desafiador do que o início do ano de 2021. O país está em recessão técnica, a taxa básica de juros (Selic) que estava nos históricos 2%, chegou ao patamar de 9,25% e naturalmente impactou os financiamentos imobiliários para as classes média e alta. Além disso, o poder de compra da população, principalmente os de baixa renda, diminuiu consideravelmente como consequência da inflação.
Segundo Fábio Tadeu Araújo, sócio diretor da consultoria Brain, a tendência é que o mercado imobiliário em 2022, seja menor do que o de 2021. Apesar disso, Brain lembra que o estoque de imóveis está baixíssimo e que houve arrefecimento das pressões de custos de insumos. No último um ano e meio, as margens das incorporadoras foram muito pressionadas pelas altas de custos de materiais de construção, como consequência do desarranjo da cadeia internacional de insumos e do crescimento da demanda doméstica.
Em dezembro, a CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) revisou sua expectativa, que era de “estabilidade de lançamentos e vendas de imóveis em 2022“, para “redução dos dois indicadores“. A redução da expectativa, deve-se a queda pela metade em outubro e novembro, da aquisição de financiamentos utilizando o FGTS. O presidente da CBIC, José Carlos Martins, afirma que “não é um momento para um otimismo exagerado, mas o setor também não vive uma derrocada”.
Outra opinião similar é a do presidente eleito da Secovi-SP, Rodrigo Luna, que reforça que o momento exige uma postura mais “pé no chão“. Depois dos recordes alcançados neste ano, de lançamentos e vendas de imóveis residências na cidade de São Paulo, que é o maior mercado imobiliário do pais, Luna conta que espera estabilidade em 2022. Nas projeções do Secovi-SP, em 2021, os lançamentos ficaram em torno de 70 mil a 75 mil unidades, e 60 a 65 mil unidades vendidas.
Baixa renda
Para empresas com atuação principal no Casa Verde e Amarela, a melhora das
margens ainda se mostra como o principal desafio a ser superado. Outro fator é que
a demanda por imóveis desse segmento, continua superior à oferta, mas a diminuição do poder de compra também contribui para a redução da velocidade de vendas quando ocorrem repasses dos custos para os preços das unidades.
Segundo o presidente da Tenda, Rodrigo Osmo, que tem foco na faixa 2 do programa habitacional, considera que está “muito difícil atuar nos segmentos de entrada, pois a rentabilidade é muito baixa” . No começo de 2022, as alterações de parâmetros de subsídios para o Casa Verde e Amarela vão entrar em vigor, mas as mudanças são consideradas ainda “muito tímidas”.
Alta dos juros tira de 2 milhões de famílias capacidade de adquirir imóvel
Com a alta da Selic, os cinco grandes bancos do país elevaram os juros do crédito mais tradicional para aquisição da casa própria de 1 a 2 pontos percentuais no período, para patamares próximos a 9% ao ano. À taxa soma-se ainda a TR (Taxa Referencial, comum em financiamentos), que estava zerada, mas que passou a subir com a alta da Selic. Com isso cerca de 2 milhões de famílias perderam condições de assumir um financiamento imobiliário ao longo de 2021.
“A alta da Selic leva a um aumento do Custo Efetivo Total, o que provoca esse impacto na demanda, principalmente na base da pirâmide“, afirma Alberto Ajzental, coordenador do curso de Desenvolvimento de Negócios Imobiliários da FGV.
Média renda
Na média renda, o ritmo de vendas começou a mostrar sinais de desaceleração, no terceiro trimestre, devido aos aumentos dos valores das unidades e à piora da macroeconomia. “Os juros altos elevam a prestação e reduzem o número de famílias que podem comprar imóveis. Mas, enquanto as taxas de financiamento imobiliário ficarem abaixo de dois dígitos, ainda temos um mercado forte e atrativo”, diz França, da Abrainc.
Bruno Mendonça, analista de mercado imobiliário do Bradesco BBI, avalia que, no
segmento de médio e alto padrão, as incorporadoras vivem um dilema. Por um
lado, prefeririam postergar lançamentos para esperar mais clareza do cenário. Por
outro, precisam apresentar novos produtos ao mercado para diluírem despesas
gerais e administrativas e para começarem, mais rapidamente, a compor receita. No
setor, a receita é contabilizada proporcionalmente às vendas e à medida que as
obras avançam.
“As incorporadoras estão mais seletivas, mas farão lançamentos, mesmo com
margens piores”, afirma Mendonça. Ele acrescenta que as empresas estão dispostas
a abrir mão ou de parte de margem ou de velocidade de comercialização. Ainda
assim, o VGV total lançado tende a diminuir, e uma das razões para isso é a redução
de novos projetos de imóveis compactos, na percepção do analista, pois o setor irá
entregar produtos com esse perfil lançados, em larga escala, em 2019.
Na capital paulista, desde que as elevações de inflação e juros começaram a afetar a
tomada de decisão de compra pela classe média, passou a haver queda das
aquisições de terrenos para projetos direcionados a esse público. As incorporadoras
listadas em bolsa vinham informando ao mercado ter áreas suficientes para
lançamentos pelo prazo de um ano e meio a dois anos, ressalta Mendonça, mas a
estimativa levava em conta velocidade de vendas superior à esperada daqui para
frente. Com isso, diz o analista, não haverá mais “tanta urgência na compra de
terrenos”.
Alta renda
No alto padrão, menos sensível às variações de curto prazo do cenário econômico,
as incorporadoras continuam a repassar altas de custos de insumos e dos terrenos
para os produtos. A escassez de projetos continua a estimular a demanda por
empreendimentos com perfil de alta renda e de luxo, como o Tonino Lamborghini
San Paolo, lançado pela Gafisa, neste mês, nos Jardins, com preço médio de R$ 40
mil por m2.
Fonte: Valor Econômico, Estadão