O Conselho Estadual de Patrimônio Cultural propôs uma revisão nas regras para os bairros dos Jardins, localizados no centro expandido de São Paulo, quase 40 anos após o tombamento. As principais mudanças envolvem o uso dos terrenos, permitindo a construção de pequenos condomínios horizontais e vilas, além de vincular a ocupação aos regulamentos de zoneamento, o que facilitaria autorizações para imóveis não residenciais.
A minuta da revisão de tombamento dos bairros Jardim América, Jardim Europa, Jardim Paulista e Jardim Paulistano está em consulta pública até 26 de junho, com uma audiência pública marcada para 3 de julho. O objetivo é concluir o processo antes do término do mandato dos atuais conselheiros, que é em 23 de julho.
A proposta de revisão para os bairros Jardins tem gerado divisão de opiniões entre os moradores e a população em geral. Enquanto uma parte expressiva critica a proposta e demonstra isso por meio de um abaixo-assinado online, que já conta com cerca de 6,3 mil apoiadores, outra parcela dos moradores, proprietários e setores da iniciativa privada reconhecem a necessidade de mudanças, embora existam divergências em relação a algumas propostas específicas da minuta.
O Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat) defende a revisão, argumentando que ela pode estimular o “repovoamento” dos Jardins, bairros conhecidos por altos índices de imóveis vazios ou subutilizados. Além disso, a proposta visa unificar as normas de construção para os quatro bairros, facilitando a aprovação de projetos no âmbito estadual.
O presidente do conselho, Carlos Augusto Mattei Faggin, assegura que a revisão não implica na perda do tombamento e que as características da região serão preservadas.
O tombamento desses bairros, que ocorreu nos anos 1910 pela Companhia City, envolve cerca de 3,1 mil imóveis em seu perímetro. Os terrenos nessa região são conhecidos por serem grandes, alguns com mais de 2 mil metros quadrados. A recente resolução de 2021 estabelece que haverá a limitação de uma residência por lote, com exceção de 19 vias mais movimentadas, como as Avenidas Europa, Nove de Julho e Estados Unidos. Entretanto, essa restrição foi removida na revisão mais recente da proposta.
Além disso, a nova proposta também revogou o veto a vilas, condomínios horizontais/verticais e edificações sobrepostas. Isso indica que, com as mudanças nas regulamentações, é possível que ocorra um processo de desenvolvimento e modernização nesses bairros históricos, especialmente no Jardim América e no Jardim Europa, devido ao tamanho dos terrenos disponíveis.
A proposta de alteração visa favorecer a criação de pequenos condomínios por meio da fusão de terrenos, permitindo que atinjam o tamanho do maior lote da quadra. Além disso, propõe-se o desmembramento, desde que os novos lotes gerados tenham pelo menos o tamanho do menor existente na quadra. Essa medida facilitará a expansão de lotes grandes, tornando os bairros mais atrativos para o mercado imobiliário. Atualmente, o remembramento de grandes lotes é permitido desde que respeite o tamanho médio dos demais da quadra.
Para lotes menores de 900 metros quadrados, é autorizado desde que a área resultante não entre em conflito com o padrão de ocupação da quadra e não seja superior ao maior lote existente. A minuta também propõe que o uso dos terrenos não seja obrigatoriamente residencial e esteja sujeito ao zoneamento local, podendo ser alterado se o município modificar essa lei, que está em revisão.
Presidente do Condephaat, Faggin fala das dificuldades técnicas em identificar se as mansões dos Jardins são de fato unifamiliares, como o tombamento originalmente previa, e que há diversos casos de sublocação irregular para mais de uma família e escritórios de empresas na região. Ele também comenta sobre o esvaziamento e as possíveis motivações:
“É algo visível. Não só com placa aluguel e venda, mas pelas casas abandonadas mesmo”, aponta. ”Há proprietários que não tem dinheiro para pagar o custo de manutenção dessas casas, que é muito alto. Se tenta alugar, não consegue. Se tenta vender, ninguém compra”, comenta.
Em uma recente consulta pública sobre a revisão das regras para os Jardins, bairro histórico de São Paulo, o arquiteto e urbanista Henrique Faggin destaca a necessidade de respeitar a entrada única e outras características dos lotes em eventuais condomínios horizontais.
Faggin ressalta que as sugestões recebidas durante a consulta pública têm sido interessantes e que também houve questionamentos. No entanto, ele afirma que essa revisão é conservadora e não traz nada revolucionário, mas representa um avanço considerável.
Essa revisão das regras para os Jardins não é a primeira a ser realizada desde o tombamento do bairro em 1986, que foi pioneiro no Estado de São Paulo ao propor a preservação do traçado e das características ambientais de uma área urbana. Ao longo das últimas décadas, outras revisões foram discutidas, algumas sendo aceitas e outras arquivadas. A mais recente ocorreu em 2021, mas há o entendimento de que não foi suficiente e que é necessário abordar todas as normas em uma única resolução, a fim de evitar textos contraditórios entre si.
Assessor executivo do Secovi-SP (que representa o setor das incorporadoras), Eduardo Della Manna avalia que as características de parte dos Jardins podem ser atrativas para a criação de condomínios horizontais de quatro a dez casas, com a possibilidade também de construção de uma única edificação subdividida. “Mas não condomínios muito grandes”, destaca. “E não vai ter uma mudança de padrão (socioeconômico).”
Ele comenta que a região tende a atrair empreendimentos com um perfil de morador semelhante ao do entorno. “A minuta ajuda a dar uma renovada naquele território dentro de certos limites. Tende a transformar, criar as condições necessárias para a transformação desses grandes lotes”, destaca. “A pior coisa para um bairro é perder morador. Imóveis abandonados estão sujeitos a invasões, a uso irregular, clandestino.”
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Informações retiradas de Priscila Mengue à Estadão